sábado, 16 de janeiro de 2016

Uma gaiola saiu à procura de um pássaro

Estranho? Nem um pouco. Uma gaiola sem seu pássaro é como queijo sem goiabada.
Uma gaiola que se preze tem de ter no mínimo um pássaro do lado de dentro.
Quando eu crescer também vou sair à procura do meu. Quero um pássaro bem bonito, forte, alto, com um bico bem grande, olhos azuis e asas multicoloridas e que cante só para mim o dia todo.
Minha mãe sempre diz que toda gaiola, mais cedo ou mais tarde, encontra seu pássaro. Prefiro mais cedo...Só que ela não concorda com esse modismo de agora de gaiola que sai à procura de seu pássaro. Mamãe é mais conservadora, sabe como é, à moda antiga... para ela, uma gaiola de família deveria ficar quietinha em casa esperando o pássaro bater na sua portinhola.
- Se para cada panela existe uma tampa; se para cada pé de sapato há o par correspondente, é óbvio que para cada gaiola tem um pássaro certo, filosofa minha mãe.
Eu tenho cá minhas dúvidas se esta fórmula dá certo porque sei de tantas gaiolas vazias e solitárias na cidade. Aqui na minha rua mesmo tem umas três já meio passadas...se não saíram em busca de seus pássaros quando mais novas, acho um pouco difícil que encontrem. Sem contar que como elas nunca tiveram suas portinholas abertas...agora estão um pouco enferrujadas...
Na minha família mesmo tem uma tia que saiu à procura de seu pássaro, mas voltou de gaiola vazia. Coitada. Mamãe disse que ela teve até depressão. Ouvi dizer que se um pássaro abre sua portinhola e vai embora fica mais difícil encontrar outro que queira viver numa gaiola que já foi usada, sabe? Por isso tem tanta gaiola mal falada por aí! É verdade! São aquelas gaiolas que já tiveram vários pássaros. Um entra e sai danado. Nenhum para. Aí fica com fama ruim.
Mas eu sou muito pequena ainda. Sou uma gaiola em formação. Nem me preocupo com isso. Por enquanto cuido de deixar minha portinhola sempre fechadinha.
Minha mãe diz que hoje em dia é melhor não confiar em ninguém. Minha mãe é uma pessoa meio triste. Deve ser porque ela também é uma gaiola vazia.
Nunca vou esquecer daquele dia. Acordei com ela chorando, pedindo, implorando para o seu pássaro ficar. Ele disse coisas horríveis: que estava cansado de cantar o dia todo, de comer sempre o mesmo alpiste, daquela rotina desgastante de tira jornal, coloca jornal, da água que até o fim do dia ficava morna e empoeirada, de fazer as necessidades praticamente junto com a comida. Um horror! Mamãe bem que tentou. Fez várias promessas, mas não adiantou nada!
Ele estava decidido. Deixou mamãe piando sozinha.


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